segunda-feira, 28 de abril de 2014

A MARCHA PARA A FRONTEIRA



ZERO HORA 27 de abril de 2014 | N° 17776


SUA SEGURANÇA | Humberto Trezzi




Impressionante a lucidez com que o general Villas Bôas aborda o papel das Forças Armadas na região de fronteira. Essa nova face militar, mais aberta e entrosada com o mundo civil, é a tônica nos quartéis felizmente. Em 2011, mais de 500 militares e estrategistas civis brasileiros se reuniram várias vezes para traçar o Livro Branco da Defesa Nacional, um compêndio destinado a radiografar as forças brasileiras e explicitar quais são os seus planos. Dos encontros, realizados em diversas capitais, saíram algumas diretrizes para o século 21. A decisão estava tomada: rumo ao oeste, guarnecer fronteiras. Veja as que dizem respeito à Amazônia:

1 - Incorporação de 59 mil militares, que se somariam aos 210 mil existentes. Os primeiros 8,3 mil soldados seriam incorporados em até quatro anos. A prioridade em contingente seria a Amazônia.

2 - Criação de 28 novos postos de fronteira na região amazônica, cada um deles com 50 integrantes, para se somar aos 21 pelotões existentes. Isso já está em andamento. Criação de uma brigada do Exército em Manaus (AM). Aumento do efetivo na Amazônia, passando de 25 mil para 49 mil militares.

Pois tudo está em andamento, inclusive na Amazônia. O general Villas Bôas diz que já estão lá 30 mil militares e acredita que chegarão a 40 mil, em 15 anos. A Marinha criou flotilhas de patrulhamento de rios. A FAB transferiu helicópteros para a região e montou o Batalhão Pantera. Manaus ganhou base de caças e de helicópteros, incluindo os modernos Blackhawk.

Quando jovem, me apresentei para o serviço militar em Cruz Alta. Lá ficava o 17º Batalhão de Infantaria. Pois hoje essa prestigiada unidade fica em Tefé (AM). É a marcha para o oeste, desde os anos 80.


EXÉRCITO, DA SELVA PARA A COPA

Como comandante na Amazônia, Villas Bôas (segundo à esquerda e no detalhe abaixo) fez contato com forças armadas dos EUA



ZERO HORA 27 de abril de 2014 | N° 17776


TAÍS SEIBT


Gaúcho de Cruz Alta, o general Villas Bôas troca, na próxima terça, Manaus por Brasília, onde assume o Comando de Operações Terrestres e tem como primeiro desafio a segurança do Mundial


São 11 mil quilômetros de fronteira com oito paí- ses, três dos quais os maiores produtores de cocaína do mundo. Perto de 5 milhões de quilômetros quadrados abrigam recursos naturais e biodiversidade. Áreas acessíveis apenas por água, outras somente por ar e algumas impossíveis de acessar. Tensões permanentes envolvendo indígenas, fazendeiros, madeireiros, garimpeiros e ambientalistas.

Some-se a esse cenário a fraca presença do Estado, enormes vazios populacionais e uma estrutura de segurança dependente do fator humano e se tem uma ideia do tamanho da responsabilidade de estar à frente do Comando Militar da Amazônia (CMA).

Quem desenha o quadro acima é o general de Exército Eduardo Dias da Costa Villas Bôas, 62 anos, há dois anos e oito meses no cargo. Gaúcho de Cruz Alta e torcedor do colorado, o militar lembra com afeto a infância no noroeste do Estado, onde viveu até os 14 anos entre fazendas e plantações de soja da família. Mas se inflama feito um nativo ao falar do território onde atuou nove anos como militar, entre idas e vindas em diferentes postos. Com esse histórico, considera-se “meio amazônico”, embora mencione mais de uma vez que toma chimarrão em seu gabinete, em Manaus, enquanto conversa, por telefone, com Zero Hora.

Os pertences pessoais já haviam sido despachados por alguma balsa a caminho de Brasília – a deterioração da BR-319 deixou a capital do Amazonas sem ligação por terra com o restante do país a partir de 1988 –, quando Villas Bôas fez um balanço crítico do que viu na Amazônia antes de assumir o novo desafio, no Comando de Operações Terrestres, tendo como primeira missão a segurança da Copa do Mundo. A cerimônia de posse foi realizada no começo de abril, mas o desligamento do CMA ocorre só na próxima terça-feira. A comparação da Amazônia com uma colônia é a mais forte de suas declarações, fato que ele atribui não a um ou outro governo, mas ao que chama de “processo histórico”.

Papel de mediador em momentos de tensão

O vazio institucional é outro ponto marcante no discurso do general, que se vale da dura que levou de um caboclo quando comandava o 1º Batalhão de Infantaria de Selva para ilustrar seu relato: “muito bonito, coronel, o Exército vem aqui com o Ibama para ver se eu faço pesca predatória e apreende a minha rede, vem aqui a Receita ver se eu vendo peixe sem nota e me multa. Agora, para colocar posto de saúde, ninguém aparece, alguém para colocar uma escolinha não aparece, alguém para transportar minha produção não aparece”.

– Eu fiquei extremamente envergonhado, porque me dei conta de que estava sendo a mão do Estado que chega para reprimir, sem que chegue antes a mão do Estado para apoiar, fomentar, desenvolver – reconhece o general.

Em pouco mais de uma hora de conversa, Villas Bôas contou como passou da vergonha à ação, assumindo o papel de mediador em situações de tensão. Falou, também, da necessidade de investir em tecnologia para melhorar a atuação do Exército na região e da preocupação com o narcotráfico. Da nova missão, limita-se a dizer que a experiência amazônica deverá ajudar.



ENTREVISTA

“O narcotráfico está se agravando no Norte”

Com Eduardo Dias da Costa Villas Bôas, 
General de Exército do Comando Militar da Amazônia


Entre um e outro gole de chimarrão em sua sala no Comando Militar da Amazônia, em Manaus, o general de Exército Eduardo Dias da Costa Villas Bôas descreve o que viu e aprendeu na região. Agora, o militar vai aplicar os conhecimentos obtidos nos tempos da selva e nas quatro décadas de Exército para assumir o Comando de Operações Terrestres. Com sede em Brasília, o comando tem a missão de auxiliar forças de segurança pública no caso de necessidade, como ocorreu na recente greve da Polícia Militar na Bahia. Fica em regime de prontidão para entrar em ação, se for preciso, durante a Copa do Mundo e as eleições, em outubro. A seguir, confira os principais trechos da entrevista concedida por telefone.

Zero Hora – O senhor tem dito que o Brasil trata a Amazônia como uma colônia. Por que o senhor diz isso?
Eduardo Dias da Costa Villas Bôas – Essa imagem da colônia surgiu conversando com um coronel do Exército, o Jarbas Passarinho, e ele me contou que, quando era governador do Pará, ele havia recebido a visita do embaixador da França, que havia percorrido a Amazônia e depois foi visitá-lo. O embaixador disse: “Governador, conhecendo a Amazônia, eu me dei conta que os países europeus têm colônias extraterritoriais ou extracontinentais, e o Brasil tem uma colônia no seu território”. O que chega aí no Sul relativo à Amazônia é incompleto, é estereotipado. Acaba a Amazônia ficando como área periférica. A Amazônia tem três importantes papéis a cumprir. O primeiro são os recursos naturais. São bastante divergentes os estudos nesse sentido, mas os mais abrangentes indicam que a Amazônia abrigaria US$ 23 trilhões em recursos naturais. O segundo papel, um pouco além, quase uma questão de geopolítica, é que existe uma pan-Amazônia. São 7 milhões de quilômetros quadrados, dos quais nós detemos mais ou menos 70%. São nove países-condôminos da Amazônia e todos têm características muito semelhantes no processo histórico. O terceiro papel decorre do fato de que a Amazônia abriga a solução para algumas das principais questões que afligem a humanidade. Estamos falando de produção de energia renovável, água, produção de alimentos, biodiversidade, mudança climática e outras questões. Quero destacar que isso não é culpa de ninguém, é decorrente de um processo histórico, mas as coisas que são feitas na Amazônia não têm como foco o benefício na Amazônia.

ZH – Situação tensas, como o recente caso da reserva de Tenharim, onde o senhor fez uma mediação, são frequentes?

Villas Bôas – Há uma tensão sempre presente, decorrente da fraca presença do Estado. As pessoas não têm atendimento de saúde, educação, transporte ou energia. Elas não têm acesso à cidadania, não têm como fazer identidade. Quase tudo que se faz na Amazônia tem caráter repressivo. Você delimita a terra, e o índio fica abandonado. É o pressuposto de que, colocando uma redoma na comunidade indígena, você vai preservar a cultura. Como você não atende às necessidades básicas, o índio é levado ao ilícito, deixa que façam extração de madeira, garimpo ilegal. Em Tenharim, foram estimulados a colocar um pedágio na Transamazônica. Mas isso gerou revolta entre fazendeiros, até que um índio sofreu um acidente de moto e morreu. Alguém estimulou os índios a pensarem que ele havia sido assassinado. Em retaliação, três pessoas que passavam pela rodovia foram mortas. Houve um princípio do que poderia ser uma catástrofe. Não havia ninguém com capacidade de conduzir a situação, então fomos lá cumprir esse papel. Esperamos que tenha gerado um novo modelo de tratamento do problema indígena.

ZH – O narcotráfico é uma das grandes preocupações?

Villas Bôas – É um problema muito sério. Nós fazemos fronteira com três países produtores de cocaína: Colômbia, Peru e Bolívia. O narcotráfico está se agravando no Norte. Uma parte da coca do Peru vai para a Colômbia e uma grande parte entra no nosso território ou para abastecer o mercado interno ou para ser mandada para o Exterior. O Brasil é o segundo maior consumidor de cocaína no mundo. Não somos produtores, mas foi desenvolvida uma variedade de coca adaptada ao clima da Amazônia baixa, que está vindo para a nossa faixa de fronteira, principalmente do lado peruano. Às vezes, índios peruanos da mesma etnia de brasileiros plantam a coca, então eles vão lá visitar e trazem para o nosso território. É o tráfico formiga. A preocupação tem sido evitar que a plantação passe para o nosso lado. Porque, a partir do momento em que a gente se tornar produtor de cocaína, vai haver um adensamento das estruturas do narcotráfico, vamos ter a presença de cartéis internacionais, uma participação maior das organizações criminosas nas grandes cidades do Brasil.

ZH – O contingente e a tecnologia de que o Exército dispõe não são suficientes para essa área?

Villas Bôas – Desde a década de 1980, o Exército vem transferindo unidades para a Amazônia. Naquela época tinha 6 mil militares, hoje são quase 30 mil e continuamos em processo de transferência. Talvez a gente vá chegar a 2030 com 40 mil. Precisamos ter sistemas modernos de comando e controle, satélites de comunicação, aumentar a mobilidade. O Exército desenvolveu um grande projeto chamado Sisfron (Sistema Integrado de Monitoramento de Fronteiras). Está sendo implantado em Mato Grosso, e, no próximo ano, vamos começar em Rondônia e no Acre. É uma linha de sensores de radares de vigilância aérea, terrestre e com veículos não tripulados na faixa de fronteira. Esse sistema vai estar interligado ao sistema operacional, porque precisamos dessa capacidade de resposta. É um sistema de vulto, de R$ 10 milhões, e vai ser implantado num período de 10 anos.

ZH – O senhor deixa o Comando Militar da Amazônia para assumir o Comando de Operações Terrestres, tendo de início um grande desafio, que é a Copa do Mundo. Como o senhor encara isso?

Villas Bôas – Eu levo daqui uma experiência que vai me ajudar muito. Este ano temos as eleições também e toda a atividade operacional do Exército fica a cargo desse comando de operações. No caso da greve dos PMs na Bahia, por exemplo, a presidente decretou estado de garantia da ordem, as tropas percorreram a cidade garantindo a segurança. Estamos garantindo a segurança de áreas indígenas no sul da Bahia e Maranhão, além das enchentes em Rondônia e no Acre. São todas atividades que estão a cargo deste órgão.

ZH – Na Copa, o Exército pode usar tropas em eventuais protestos?

Villas Bôas – Usamos como exemplo a Copa das Confederações, em que os órgãos de segurança pública, com maior ou menor dificuldade, cumpriram suas funções. Mas só atuamos quando esses órgãos esgotarem sua capacidade. Então, na Copa do Mundo, nós só seremos empregados nesse tipo de ação caso haja necessidade.

ZH – Qual será o foco da atuação do Exército durante a Copa?

Villas Bôas – Temos forças de contingência para atuar em casos de emergência e forças de segurança para pontos estratégicos. Chamamos de pontos sensíveis onde estaremos fazendo a segurança. Estamos em condições de atuar também em situações antiterrorismo, já estamos atuando na parte de inteligência, e na parte de alguma emergência química ou bacteriológica.



segunda-feira, 21 de abril de 2014

A FORÇA DA DISSUASÃO

PORTAL DO SENADO, DEBATE


Defesas sólidas tornariam muito custoso ao agressor um ataque ao nosso país. Para repelir invasões, é preciso estar preparado para combater com competência


Piloto na cabine de um avião C-105, durante a Operação Coruja Verde,
em Manaus, treina com equipamentos especiais para visão noturna
(Foto: Johnson Barros/FAB)


Dissuadir — convencer (alguém ou a si mesmo) a mudar de ideia, a abdicar de uma decisão. O Brasil, ainda desde o fim do Império, forjou as suas relações com os demais países com base nesse conceito. O verbo está no cerne da Estratégia Nacional de Defesa (END), cujo primeiro objetivo é “dissuadir a concentração de forças hostis nas fronteiras terrestres, nos limites das águas jurisdicionais brasileiras, e impedir-lhes o uso do espaço aéreo nacional”. Para dissuadir, porém, é preciso estar preparado para combater, enfatiza mais adiante o mesmo documento.

O chanceler Celso Amorim avaliou, na audiência pública com os senadores, que os mais de 65 anos sem nenhum conflito de natureza global e a natureza pacífica do Brasil podem, eventualmente, transmitir a falsa ideia de que o país não precisa de defesa, de que ninguém vai nos atacar ou investir contra os nossos interesses.

“Isso não pode ser uma certeza. Temos que transformar isso numa impossibilidade, tanto quanto possível. A Estratégia Nacional de Defesa muito claramente aponta para essa necessidade de dissuasão, em termos de sermos capazes de causar dano mínimo a qualquer aventura, seja em função do nosso petróleo, da Amazônia, da nossa base de produção de alimentos, enfim”, justifica o ministro.

Como explicitou o doutor em Ciência Política Eliézer Rizzo de Oliveira no artigo “As diretrizes da Estratégia Nacional de Defesa”, o Brasil tem interesses a defender por intermédio do seu poderio militar, ainda que não tenha inimigos estratégicos definidos e declarados.

A opção pela dissuasão é tema pacificado na comunidade de defesa nacional. Não se ouvem vozes apregoando uma mudança nessa postura histórica, ou reivindicando a transformação do país em uma potência belicosa e beligerante, mas muitos experimentados militares e estudiosos advertem que, para chegar a uma capacidade satisfatória de dissuasão, é preciso concentrar investimentos e implementar as diretrizes da END plenamente.

Estratégia adequada


O professor Darc Costa explicou que a estratégia tem três grandes formas de atuar:

a) na ação direta, um país tem força suficiente para esmagar o oponente (é uma forma praticada pelos países mais desenvolvidos, mais fortes);

b) na ação indireta: o país não tem força suficiente para esmagar o inimigo, mas consegue progressivamente enfraquecê-lo;

c) a dissuasão: quando o país tem defesas suficientes para tornar muito custosa para um agressor a iniciativa de um ataque.

“O Brasil não é o mais forte, nem é o mais fraco, mas deve praticar a chamada estratégia da dissuasão; ou seja, deve dizer a quem estiver disposto a nos agredir que faremos algo de tal forma que ele não sairá incólume desse processo. É isso que devemos pensar em fazer. Mas é preciso que exista uma convincente força militar combinada: terrestre, naval e aérea.”

Para isso, complementa o especialista, em uma guerra convencional, o Brasil precisa dispor de efetivos treinados e bem armados, capazes de durar no combate, mesmo enfrentando adversários muito mais poderosos (veja mais na seção Realidade Brasileira, a partir da pág. 50). E dispor de autonomia estratégica, ou seja, o armamento e o equipamento destinados a essa força dissuasória deverão ser fabricados no Brasil tanto quanto possível, dentro de um planejamento de logística, a fim de evitar embargos internacionais no cumprimento da missão de defesa.

Para o almirante e ex-ministro Mario Cesar Flores, “o peso relativo do Brasil no funcionamento tranquilo desse mundo imperfeito será inferior ao potencial sugerido por suas circunstâncias geográfica, econômica e demográfica, se não contar com o respaldo de poder militar compatível — a já citada compatibilização das políticas externa e de defesa”, escreveu ele na edição de julho passado da revistaInteresse Nacional.

Ele construiu um cenário ideal em que o Brasil disporia de poder militar:

1) ágil/móvel, com capacidade para abortar rapidamente agressões ao Brasil ou no mínimo deixar claro que, se praticadas por potências de grande nível estratégico, não teriam custo baixo. Ou seja, um poder militar útil para dissuadir agressões e estimular soluções negociadas;

2) coerente com o Brasil na sua região — América do Sul e Atlântico Sul, ao menos o ocidental —, capaz de apoiar nela a conciliação pacífica de contenciosos e contribuir para a tranquilidade e ordem regional;

3) capaz de prover a ação militar necessária à tranquilidade, segurança e respeito à lei brasileira e à internacional adotada pelo Brasil, no seu território terrestre e marítimo. Embora se refira ao Brasil lato sensu, a meta exige particular atenção à Amazônia e suas fronteiras permeáveis, à costa marítima (com as instalações de petróleo e gás, de peso crescente na segurança nacional) e ao espaço aéreo.



Raposas e lobos

Doutor em Economia pela Universidade de Hamburgo, o professor da UnB e diplomata Adriano Benayon é direto em sua avaliação: “Para ficarmos tranquilos no pré-sal, precisaremos de reforço nas nossas Forças Armadas. Quem quiser continuar sendo galinha cercada de raposas e lobos está destinado à sorte das mais tristes”, prevê Benayon.

“Se o circo começar, e isso pode ocorrer de repente, ninguém vai querer saber da nossa índole pacífica. Vai importar, sim, para nossa juventude na linha de frente, o poder de dissuasão de que dispõe, não para lutar, mas, sobretudo, para fazer o inimigo desistir da luta”, complementa o coronel de infantaria e Estado-Maior Paulo Ricardo da Rocha Paiva, em seu artigo "As forças mambembes da 6ª potência econômica", publicado em 13 de janeiro no site www.defesanet.com.br.

O assessor especial do Ministério da Defesa, ex-deputado federal José Genoíno, defendeu, em palestra durante os debates para elaboração do Livro Branco da Defesa Nacional, que o maior papel a ser desempenhado pelo Brasil, no futuro, é diminuir suas vulnerabilidades. “Defesa é o elo entre a nação e as Forças Armadas e, no que diz respeito ao Brasil, a preservação da Amazônia é um componente fundamental desse elo”, disse.


José Genoíno, do Ministério da Defesa:
maior papel do país, no futuro, é diminuir
as suas vulnerabilidades (Foto: Roosewelt Pinheiro/ABr)

O então comandante militar da Amazônia, general Luis Carlos Gomes Mattos, ressaltou a necessidade de o Brasil desenvolver formas mais eficazes de coibir ilícitos nas fronteiras e manter diálogo permanente com os governos das demais nações que compõem a Amazônia sul-americana para a defesa da região.


Dissuasão só será eficaz se país dispuser de efetivos treinados e bem armados, capazes de durar no combate (Foto: Glauco Brandão)

DEFESA NACIONAL É PRIORIDADE DO BRASIL

PORTAL DO SENADO, DEBATE


Em crescimento econômico e prestes a ocupar espaço mais proeminente no cenário internacional, Brasil conclui que é preciso ter defesa forte para dissuadir e repelir eventuais agressões



Blindados do Exército participam da Operação Ágata, no ano passado: ainda que indesejada, situação de conflito não pode ser excluída, pela cobiça aos recursos nacionais (Foto: Exército Brasileiro)

Pacífico por tradição e por convicção, o Brasil vive em paz com seus vizinhos há 142 anos, desde o término da Guerra do Paraguai. Suas relações com os outros países são guiadas pelos princípios constitucionais da não intervenção, da defesa da paz e da solução pacífica dos conflitos. Não exibe nem nunca demonstrou pretensões hegemônicas dentro ou fora do continente americano.

Mas o Brasil é grande, um gigante. Acomodaria praticamente toda a Europa em seu território, que atinge 4,5 mil quilômetros de norte a sul (quase um voo de Lisboa a Moscou). São 8,5 milhões de quilômetros quadrados e 200 milhões de habitantes. Além de grande, é rico em recursos. Temos muita água — 12% da reserva mundial — e terras férteis. Mais ainda, dispomos de fontes abundantes (inclusive das renováveis) de energia. O país caminha para se confirmar como a sexta economia mundial. ­
O mundo está de olho no Brasil.

Não é ufanismo, é a realidade, lastreada por abundantes informações e estatísticas trazidas ao Senado Federal por duas dezenas de especialistas. Somos — mais ainda agora, com o advento do pré-sal — alvo de cobiça internacional, pelos recursos naturais e pela privilegiada situação
geopolítica.

A cobiça e as ameaças dela decorrentes à segurança de nosso território, nossas riquezas e nossa população foram meticulosamente avaliadas em audiências públicas para debater defesa nacional, realizadas pela Comissão de Relações Exteriores (CRE).

“Não podemos excluir uma situação, que não desejamos, de conflito que possa haver entre outras potências, em que os recursos do Brasil venham a ser objeto de alguma cobiça”, reconheceu o ministro da Defesa, Celso Amorim, que assumiu o cargo em agosto passado e construiu sua vida empregando a diplomacia como arma.


General José Carlos de Nardi, ministro Celso Amorim e senador Fernando Collor, no primeiro dos debates realizados na CRE (Foto: Márcia Kalume/Agência Senado)

Não estamos prontos

A conclusão dos debatedores foi unânime: não estamos adequadamente preparados, hoje, para repelir ataques externos. As três Forças Armadas (Exército, Marinha e Aeronáutica) carecem de equipamentos mais modernos e em maior quantidade. Os contingentes não são suficientes, estão mal distribuídos no território nacional e necessitam de melhor
treinamento.

“As Forças Armadas brasileiras vivem à beira do sucateamento, sem equipamentos atualizados e sem treinamento permanente, o que causa a impossibilidade de uma pronta resposta no caso de um acionamento pelo poder político”, assegura Eliézer Rizzo de Oliveira, doutor em Ciência Política e ex-professor da Faculdade de Direito da Universidade Presbiteriana Mackenzie em Campinas (SP).

Professor Rizzo: Forças Armadas
estão incapazes de dar pronta
resposta a uma agressão
(Foto: Antoninho Perri/Ascom-Unicamp)

O caminho para suprir essas deficiências foi definido pelo Plano Nacional e pela Estratégia Nacional de Defesa, aprovados em 2008 (veja infográfico abaixo). O plano é focado em ações estratégicas de médio e longo prazo e objetiva modernizar a estrutura nacional de defesa, atuando em três eixos estruturantes: reorganização das Forças Armadas, reestruturação da indústria brasileira de material de defesa e política de composição dos efetivos das Forças Armadas. O país precisa, para se proteger, de mais aviões, tanques, submarinos, satélites, mísseis... E tudo isso tem um preço, bastante alto, aliás.



“Sei do grau de dificuldade que as Forças Armadas têm para se modernizar e o alto valor que será empregado nisso. Acho também que não há nenhum brasileiro que se oponha a isso, porque ninguém quer guerra, mas, se queremos a paz, temos de estar preparados para a guerra. Isso já é milenar. Os chineses já nos ensinaram lá atrás”, argumentou Blairo Maggi (PR-MT).


Blairo Maggi acredita que nenhum brasileiro
se opõe à modernização das Forças Armadas,
necessária à segurança do país
(Foto: Geraldo Magela/Agência Senado)

O problema é que, na ainda jovem democracia brasileira, até muito recentemente se falar em gastos militares era quase heresia. Também por isso, nas décadas recentes, faltou dinheiro para reequipar a defesa nacional, um processo caro, demorado e que costuma esbarrar em pressões políticas as mais diversas. O orçamento da defesa mantém, ao longo dos últimos anos, um patamar em torno de 1,5% do produto interno bruto (PIB). Porém, três em cada quatro reais a ela destinados são usados para pagar a folha de pessoal, em que as pensões são complicador
adicional.

Visão do passado

Ao falar em audiência no ­Senado, Celso Amorim destacou a sua “clara convicção” de que a defesa tem um papel cada vez mais relevante na agenda nacional. O ministro admitiu, no entanto, que “ainda há muitos setores de opinião pública que ainda veem a defesa com olhos do passado”.

— Um passado no qual, em função da Guerra Fria, o Brasil tinha papel totalmente secundário na organização da ­ordem mundial e da própria segurança internacional. Do ponto de vista global, do ponto de vista estratégico, qualquer enfrentamento que viesse a ocorrer seria um enfrentamento entre as superpotências e a cada país cabia apenas escolher de que lado iria ficar e gozar da proteção dessa superpotência. Nesses tempos longos, a nossa preocupação era muito maior com nossos vizinhos do que com a segurança internacional — raciocina Celso Amorim.

Militares, diplomatas, cientistas e outros especialistas reiteraram nos debates que é preciso inserir as Forças Armadas dentro desse projeto do novo Brasil.

“A defesa nacional será tão mais robusta quanto mais contar com a sociedade. Ela não pode legitimar os seus pleitos, a não ser por meio de compreensão, por parte da sociedade, das necessidades que tem o Brasil”, acredita o ministro Celso Amorim.

Como afirmou o professor Darc Antonio da Luz Costa, conselheiro do Centro de Estudos Estratégicos da Escola Superior de Guerra (ESG), se o Brasil quiser ocupar o lugar que lhe cabe no mundo, precisará estar preparado para defender-se não somente das agressões, mas também das ameaças.

— Estratégia nacional de defesa é inseparável de estratégia nacional de desenvolvimento. Esta motiva aquela. Aquela fornece escudo para esta. Cada uma reforça as razões da outra. Em ambas, se desperta para a nacionalidade e constrói-se a nação. Defendido, o Brasil terá como dizer não, quando tiver que dizer não. Terá capacidade para construir seu próprio modelo de desenvolvimento — define o
professor.

Investimentos

Com essas análises concorda a pesquisadora argentina Carina Solmirano, do Stockholm International Peace Research Institute (Instituto de Pesquisa pela Paz Internacional de Estocolmo, Sipri, na sigla em inglês), que desde 1988 publica ranking mundial dos orçamentos de defesa no mundo.

“Torna-se evidente a necessidade de se realizar um estudo mais aprofundado sobre o quanto, de fato, o país investe em programas de defesa, dado o forte indício de que estes investimentos correspondem a um volume bastante inferior ao necessário para manter as Forças Armadas brasileiras com capacidade tecnológica e humana compatível com as dimensões do país”, disse à imprensa a pesquisadora, quando esteve no Brasil para lançar o ranking, em abril de 2011.

O país, porém, não parte do zero em sua caminhada rumo a um sistema de defesa compatível com as suas necessidades e pronto para encarar os desafios do século 21 e dos seguintes. O Brasil conta, na visão dos debatedores, com um corpo de profissionais dedicados e qualificados nas Forças
Armadas.

“Os militares brasileiros são reconhecidos internacionalmente por sua alta qualidade, por seu alto nível profissional. Isso é um reflexo da maneira como o militar brasileiro vê a sua formação: pode faltar orçamento, pode faltar dinheiro para munição e para alimento, mas as Forças Armadas não abrem mão do orçamento para suas escolas militares. Equipamentos podem ser comprados de uma forma célere, mas a formação dos homens que vão usar esses equipamentos não se dá do dia para a noite”, afirmou Joanisval Brito Gonçalves, consultor legislativo do Senado e especialista em defesa.

Patriotismo

Depois de dedicar 40 anos de sua vida ao Exército, grande parte deles no treinamento de novos oficiais — foi, inclusive, instrutor na Academia Militar das Agulhas Negras, da Escola de Aperfeiçoamento de Oficiais e da Escola de Comando e Estado-Maior —, o general da reserva Luiz Eduardo Rocha Paiva, membro da Academia de História Militar Terrestre, deu testemunho emocionado sobre o compromisso de seus colegas de farda com a defesa do país.

“O militar [brasileiro] é dedicado, acredita na sua missão, esforça-se, é bem preparado dentro das limitações. Porque ser bem preparado, sem ter os instrumentos para se preparar para o combate, é bem preparado de um lado. Quer dizer, não é adestrado em usar o equipamento moderno que não tem, mas é dedicado e formado em cima de valores que o põe na mais alta instância: o patriotismo, o dever, a lealdade, a integridade e a coragem. Isso os senhores vão ter de suas Forças Armadas, mesmo que seja para perder”, assegura o general.

FORÇAS ARMADAS NO COMBATE AO CRIME

PORTAL DO SENADO, DEBATE

Governo coloca militares do Exército na segurança pública


Uma das questões mais candentes envolvendo o emprego das Forças Armadas é sua crescente atuação na segurança pública. A Estratégia Nacional de Defesa reconhece os deveres previstos no artigo 142 da Constituição Federal, mas ressalva que “a legitimação de tais responsabilidades pressupõe, entretanto, legislação que ordene e respalde as condições específicas e os procedimentos federativos que deem ensejo a tais operações, com resguardo de seus integrantes”.

A preocupação das Forças Armadas com os limites de sua atuação e responsabilidade e com a legitimação das suas ações nas questões internas data do Império, afirma Joanisval Brito, consultor do Senado ouvido pela Comissão de Relações Exteriores. Já naquela época, o Clube Militar pediu à então regente, a princesa Isabel, que poupasse os militares de sair à caça de escravos fugitivos. E ainda hoje essa questão resta mal resolvida.

O principal argumento dos que criticam o emprego das Forças Armadas na segurança pública é de que essa tarefa exige atitude e doutrina totalmente diferentes do que é ensinado nos quartéis. O militar é treinado para reconhecer o inimigo e combatê-lo. O seu sucesso é medido pelo número de inimigos eliminados ou postos fora de combate. No entanto, no caso do combate ao crime comum, o soldado enfrenta um concidadão, um brasileiro que deve ter seus direitos civis e sua integridade física respeitados e garantidos até o limite do possível, independentemente do crime que ele tenha cometido.

Em 2010, Tarso Genro, então ministro da Justiça, a propósito da política mexicana de combate ao tráfico de drogas, afirmou que “a experiência de substituição da polícia pelas Forças Armadas no enfrentamento do crime organizado, como está acontecendo no México, é totalmente desastrosa. Desastrosa para o Exército, para a segurança pública e para a população. Não há exemplo onde isso tenha acontecido com sucesso a não ser, obviamente, em ocupações de cidades em época de guerra”.

Ainda assim, a partir do governo Luiz Inácio Lula da Silva, foram criadas as brigadas Garantia da Lei e da Ordem, em Campinas, no estado de São Paulo, e Operações Especiais, em Goiânia, para garantir deslocamento mais rápido das tropas militares do Exército e atender às crises da segurança pública do país.

MILITARES DO EXÉRCITO E POLÍCIAS NA PACIFICAÇÃO DE FAVELAS

PORTAL DO SENADO, DEBATE


Forças Armadas e segurança pública: militares do Exército e polícias na pacificação de favelas



Para Joanisval Brito, situações como a participação das Forças Armadas na pacificação de favelas no Rio de Janeiro e em crises como a recente greve de policiais na Bahia, ainda que em conjunto com a Força de Segurança Nacional, são exemplos de um caminho perigoso e até inconstitucional. “Quem lida com segurança pública, quem está preparado para lidar com segurança pública e quem deve lidar com segurança pública são as polícias; não são as Forças Armadas”, criticou o consultor.

Joanisval destacou que o emprego das Forças Armadas nessas situações pode causar danos à autoestima dos militares, que passam a ser coadjuvantes das forças policiais quando, constitucionalmente, as polícias é que são consideradas forças auxiliares de reserva do Exército. Já o general Rocha Paiva, em sua exposição aos senadores, se disse favorável ao emprego das Forças em segurança pública, desde que imprescindível e por pouco tempo.

No entanto, ele se preocupa com os demais usos das Forças Armadas. “Há o momento necessário. Naquele momento de 2010, quando elas entraram no Morro do Alemão, o Estado tinha perdido o controle da situação. Mas ficar lá mais de um ano, não. Isso não é admissível. Exército, Marinha, Aeronáutica não são agências multitarefas. E aí o que começa a acontecer? Na segurança pública, estradas e aeroportos, no desvio das águas do São Francisco, na distribuição de água no Nordeste, elas podem estar em muitas dessas atividades, mas isso virou uma obsessão nacional”, afirma Rocha Paiva.

Em 2010, o pesquisador Oscar Medeiros Filho, em sua tese de doutorado para a Universidade de São Paulo, fez pesquisa com estudantes de três das mais famosas escolas militares do país. A grande maioria deles, 84,6%, concorda que a atuação das Forças Armadas no combate ao crime tende a aumentar e 64% entendem que essa atuação é viável.

SEGURANÇA PÚBLICA PIORA E SOCIEDADE PRESSIONA

PORTAL DO SENADO, DEBATE


Soldados do Exército em operação no Morro do Alemão (RJ):
Forças Armadas envolvidas em ações de segurança pública
(Foto: Pedro Pantoja/Jornal O Povo)

Como em quase todos os estados em que a segurança pública deixa muito a desejar, a população volta-se para as Forças Armadas como um último recurso, uma reserva de integridade e força que teria o condão de resolver o problema para o qual políticos, policiais, Judiciário e a própria sociedade há décadas não conseguem encontrar uma solução.

“Sem direção política clara, sem definições precisas sobre suas atribuições, sem meios mínimos para garantir a soberania da nação, as Forças Armadas (em especial o Exército) são cada vez mais empurradas para as tarefas de garantia da lei e da ordem”, afirma o cientista político João Paulo Soares Alsina Junior.

Para Alsina, a maioria esmagadora da população não sabe como o sistema de segurança pública está organizado e, consequentemente, não tem a menor ideia de quem é a culpa pela situação de insegurança que vive. Na visão da maioria, o Executivo das três esferas, as várias polícias — Força Nacional de Segurança, Polícia Federal, polícias estaduais e guardas municipais —, o sistema carcerário, o Judiciário e o Legislativo parecem todos embolados, sem papel definido, enquanto a situação só piora.

“É preciso, portanto, que se alertem os formadores de opinião sobre o extremo perigo que o Brasil corre ao optar na prática — ainda que não na teoria — pela utilização das Forças Armadas no campo da segurança pública. Exemplos abundam sobre a inconveniência e a ineficiência do emprego dos militares em tarefas policiais”, alerta Alsina.

Vários especialistas compartilham com Alsina a ideia de que a solução está nos sistemas de segurança pública. Ou antes, na reforma deles, na sua articulação, cooperação e integração. Eles temem que se possa assistir a cada vez maiores áreas do território nacional dominadas por criminosos, que, no entanto, são cidadãos brasileiros, e não inimigos a serem eliminados pelas Forças Armadas.

“As Forças Armadas nacionais custam ao erário uma soma não desprezível de recursos. No entanto, esses recursos não se traduzem em capacidade de dissuasão convencional aceitável, tampouco em forças aptas a dar conta satisfatoriamente da garantia da lei e da ordem. Esse tipo de emprego praticamente assegura a materialização de dois fenômenos profundamente indesejáveis: a corrupção das forças constitucionalmente responsáveis pela defesa da ­soberania nacional (expostas ao convívio com a marginalidade) e a não resolução da crise da segurança pública (ao manter indefinidamente esquemas paliativos de intervenção que não atacam o cerne do problema)”, conclui Alsina.

DEFESA NACIONAL E SEGURANÇA PÚBLICA

PORTAL DO SENADO, DEBATE

Constituição Federal, Forças Armadas, Polícias, civis e militares: defesa nacional e segurança pública no país

A função das Forças Armadas também foi objeto de discussões nas audiências sobre defesa nacional promovidas pela CRE. Como o assunto é tratado pela Constituição Federal no artigo 142, que prevê a atuação das Forças em segurança pública, e também no artigo 144, que atribui exclusivamente às polícias o combate ao crime, as hipóteses de emprego das Forças não estão suficientemente claras, afirmam especialistas ouvidos pela comissão do Senado.
O que diz o texto da Constituição
Artigo 142

As Forças Armadas, constituídas pela Marinha, pelo Exército e pela Aeronáutica, são instituições nacionais permanentes e regulares, organizadas com base na hierarquia e na disciplina, sob a autoridade suprema do Presidente da República, e destinam-se à defesa da pátria, à garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem.
Artigo 144

A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos seguintes órgãos: I – polícia federal; II – polícia rodoviária federal; III – polícia ferroviária federal; IV – polícias civis; V – polícias militares e corpos de bombeiros militares.

Além disso, subsiste uma grande confusão no país a respeito dos conceitos de segurança nacional, defesa nacional e segurança pública, inclusive na Estratégia de Nacional de Defesa, afirmam o consultor do Senado Joanisval Brito Gonçalves e o especialista em segurança Gunther Rudzit.

Ditadura

Na origem desse problema, está o próprio contexto da elaboração da Constituição Federal de 1988. Àquela época, logo depois do fim dos governos militares, os constituintes ignoraram o conceito de segurança nacional em repúdio à Lei de Segurança Nacional, da qual se serviram os governos militares para legitimar ações contra os “subversivos” que lutavam contra a ditadura.

O então ministro da Defesa, Nelson Jobim, em artigo sobre a elaboração da Estratégia Nacional de Defesa, afirmou que “o poder civil, que sucedeu ao regime militar, identificava, em seu imaginário, os temas de defesa com repressão política. O tema, por isso, foi marginalizado durante os trabalhos da Assembleia Constituinte”.

Ainda segundo Jobim, em consequência dessa marginalização, os militares chamaram a si a tarefa de formular a política de defesa, que saiu da agenda nacional. O poder público passou então a considerá-la assunto exclusivamente militar.

“No meio acadêmico, desenvolveu-se processo semelhante. São poucos os estudiosos que se vincularam aos temas de defesa. Há mesmo pesquisadores que foram questionados — por seus colegas — sobre as suas motivações ao orientarem-se para assuntos militares. Em outros países, tais temas são objeto de profundo interesse intelectual”, afirmou o ex-ministro.

Ex-ministro Nelson Jobim lembra que tema da defesa foi marginalizado
na Assembleia Constituinte (Foto: Wilson Dias/ABr)

Segurança

Para Joanisval Gonçalves e Gunther Rudzit, segurança nacional seria o conceito guarda-chuva, englobando a ideia de segurança pública, que tem a ver com crimes comuns praticados em solo nacional, e a de defesa nacional, que se relaciona às ameaças externas. Dessa forma, na prática, de acordo com os especialistas, para que o país tenha segurança nacional, é necessário que o sistema de segurança pública funcione, com as polícias mantendo o crime em níveis mínimos aceitáveis, e que o setor de defesa, a cargo das Forças Armadas, tenha controle sobre as fronteiras e esteja preparado para proteger os brasileiros, o patrimônio e o território do país de qualquer ameaça. Polícias e Forças Armadas teriam assim papéis bem definidos, de acordo com a vocação de cada uma.

FORÇAS ARMADAS: EQUIPAMENTOS, DESAFIOS E PRIORIDADES

PORTAL DO SENADO, DEBATE


Equipamentos de defesa para as Forças Armadas do Brasil: submarino nuclear, satélite de comunicação e novos caças. Precária situação operacional das Forças Armadas do Brasil é o principal desafio para formulação e implementação da Estratégia Nacional de Defesa

Um dos cinco submarinos brasileiros em ação na costa: insuficientes para proteger um dos maiores litorais do mundo (Foto: Marinha do Brasil)

Em torno da situação operacional das Forças Armadas, gira toda a discussão sobre as estratégias, equipamentos e sistemas de defesa do Brasil. Falta tudo. A maioria dos equipamentos é obsoleta. Não há suficiência de insumos básicos, como balas de canhão para treinamento. No Exército, de acordo com o general Luiz Eduardo Rocha Paiva, “existem 27 brigadas blindadas, mecanizadas, motorizadas etc., todas inoperantes”.

A situação da Marinha e da Aeronáutica não é melhor. Embora o Ministério da Defesa não divulgue o número e a categoria dos equipamentos dessas Forças, sabe-se que há uma grande parte indisponível em razão de problemas de manutenção, como a falta de peças, ou simplesmente por estarem velhos demais para voar. Adquiridos na década de 1970, os caças franceses Mirage, por exemplo, já deveriam estar aposentados, mas ainda são um dos principais recursos para fazer valer a soberania do país em seu espaço aéreo, um dos maiores do mundo. Segundo o brigadeiro do ar Carlos de Almeida Baptista Junior, um Mirage leva de dois a quatro mísseis, enquanto um americano F-18, que o Brasil cogita adquirir, leva de oito a dez mísseis. “O poder de alcance, o poder de fogo, a modernidade dos sistemas de arma dos aviões modernos, dessa quarta geração, é infinitamente superior”, lamentou o brigadeiro, em sua exposição aos senadores da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional (CRE).

Na Marinha, o Brasil dispõe de cinco submarinos convencionais, nenhum nuclear, um porta-aviões, oito fragatas e cerca de meia centena de outras embarcações, quase todas já tecnologicamente superadas. Embora os números sejam considerados confidenciais, sabe-se também que muitas estão indisponíveis por impossibilidade de manutenção. E isso para patrulhar e defender uma das maiores costas marítimas do mundo, além da Amazônia, um imenso emaranhado de rios e selva por onde circulam guerrilheiros, traficantes de drogas e contrabandistas.

De acordo com o general Rocha Paiva, mesmo os equipamentos previstos nos planos de reaparelhamento das Forças Armadas até 2025 não serão suficientes para a Armada cumprir plenamente sua função. “A Marinha precisa de uma esquadra de superfície muito forte. Como não vai ter tão cedo, a Estratégia Nacional de Defesa definiu ‘a negação do uso do mar’ como sua tarefa principal, prioritária. Para isso, ela precisa de uma força de submarinos e não vai bastar um submarino nuclear”, disse.

Prioridade

A propósito dessa indigência de equipamentos nas Forças Armadas do Brasil, o senador Luiz Henrique (PMDB-SC) afirmou que, se a Argentina tivesse um submarino nuclear e seu próprio satélite de comunicação, a história da Guerra das Malvinas (1982) seria outra.

“O submarino nuclear, o satélite geoestacionário, os novos caças, tudo isso, em nossa opinião, deve ser encarado como absoluta prioridade para o futuro do nosso país”, disse.

Também falando dessa situação, o senador Blairo Maggi (PR-MT) defendeu a ideia de que, embora os gastos com equipamentos para a defesa do Brasil sejam altos, eles são necessários. “Sei do grau de dificuldade que as Forças Armadas têm para se modernizar e o alto valor que será empregado nisso, mas, se queremos a paz, temos de estar preparados para a guerra.” Também o presidente da CRE, senador Fernando Collor (PTB-AL), considera que “é necessário empenho ainda maior do Executivo, para que as Forças Armadas estejam prontas a atuar quando chamadas”.

Celso Amorim, ministro da Defesa, assegurou que todos os equipamentos a serem adquiridos pelas Forças Armadas servirão tão somente para que o Brasil tenha o poder dissuasório necessário. “Em outras palavras, é preciso dizer ‘não vem que não tem’. Nós não vamos nos meter em outras aventuras, não temos essas pretensões. Seguramente nunca praticaremos atos de agressão — aliás, a nossa Constituição nos proíbe —, mas temos de demonstrar a nossa capacidade defensiva”, garantiu.

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http://www.senado.gov.br/noticias/Jornal/emdiscussao/defesa-nacional/forcas-armadas-submarino-nuclear-satelite-comunicacao-cacas.aspx

segunda-feira, 14 de abril de 2014

O EXÉRCITO E O PODER MODERADOR



O Estado de S.Paulo 14 de abril de 2014 | 2h 03


Oliveiros S. Ferreira* 


Muitos, se não todos os artigos escritos a propósito da passagem dos 50 anos do 31 de Março de 1964, não fazem menção à ideia (ou seria uma tese) fartamente difundida na Academia segundo a qual as Forças Armadas desempenharam, durante a República, papel semelhante ao representado pelo Poder Moderador no Império. Essa tese inspirou também o "brasilianista" Alfred Stephan no seu livro de grande repercussão sobre os militares e a política no Brasil.

A ocasião é oportuna para que se possa rever essa tese. A revisão é necessária para que se tenha da República e das intervenções militares uma visão mais clara e, provavelmente, mais correta.

Essa revisão deverá ser iniciada por uma leitura da Constituição de 1824. Só à luz do que foi o Poder Moderador no Império se poderá afirmar que as Forças Armadas prolongaram ou não na República - em circunstâncias e forma diferentes, mas com o que seria igual propósito - a instituição imperial.

Que é e como age o Poder Moderador no Império? É um Poder neutro. Delegado privativamente ao imperador "para que incessantemente vele sobre a manutenção da Independência, equilíbrio, e harmonia dos mais Poderes Políticos" (Executivo, Legislativo e Judiciário), ele o exerce para nomear os senadores; convocar a Assembleia-Geral extraordinariamente, "quando assim o pede o bem do Império"; sancionar os decretos e resoluções da Assembleia-Geral para que tenham força de lei; aprovar e suspender interinamente as resoluções dos Conselhos Provinciais; prorrogar ou adiar a Assembleia-Geral; dissolver a Câmara dos Deputados nos casos em que o "exigir a salvação do Estado", convocando imediatamente outra que a substitua; nomear e demitir livremente os ministros de Estado; suspender os magistrados; conceder anistia "em caso urgente, e que assim aconselhem a humanidade, e bem do Estado". Consolidada a figura do presidente do Conselho, o imperador o escolhia e a ele cabia a tarefa de formar o Gabinete, que deveria sempre ter a aprovação da maioria da Câmara.

As intervenções militares foram em grande número: 1889 (Proclamação da República), 1893 (Revolta da Armada), 1922 (os 18 do Forte), 1924 (revolução em São Paulo e início da Coluna Prestes), 1930 (a Revolução), 1935 (a Intentona), 1937 (o Estado Novo), 1945 (deposição de Getúlio Vargas), 1954 (suicídio de Vargas), 1954 (memorial dos coronéis), 1955 (a Novembrada, deposição de Carlos Luz e Café Filho), 1956 (Jacareacanga), 1959 (Aragarças), 1961 (tentativa de impedimento de João Goulart),1963 (revolta dos sargentos), 1964 (deposição de Goulart), 1968 (AI-5). Examinemos essas intervenções.

1889 - O Exército depõe o imperador e instala a República.

1893 - A Revolta da Armada não tem consequências institucionais.

1922 - A revolta, de caráter corporativo, é limitada aos 18 do Forte de Copacabana e, por motivos outros, à Escola Militar.

1924 - Uma revolução malograda, não uma intervenção. O mesmo se diga da Coluna Prestes.

1930 - Uma revolução com grandes consequências institucionais, políticas e sociais, não uma intervenção.

1935 - Revolta malograda, ideologicamente marcada por sua chefia, visando a uma transformação institucional.

1937 - Golpe de Estado chefiado pelo presidente da República, que assume poderes ditatoriais.

1945 - Deposição do presidente da República e entrega do poder ao presidente do STF.

1954 - Fevereiro: Grupo de coronéis do Exército divulga manifesto contra o aumento do salário mínimo e a política do ministro do Trabalho, Goulart. Os ministros da Guerra e do Trabalho demitem-se. Agosto: Manifestação dos chefes militares pedindo a renúncia do presidente e a entrega do cargo ao vice-presidente da República. O suicídio de Vargas não foi exigido nem induzido - foi autodeliberado.

1955 - Deposição de dois presidentes para, meses depois, dar posse ao presidente eleito.

1956 e 1959 - Revoltas sem importância militar, visando à deposição de JK.

1961 - Os ministros militares tentam, sem êxito, impedir a posse de Goulart, vice-presidente da República.

1963 - Impedidos de candidatar-se, sargentos revoltam-se em Brasília. Há combates.

As intervenções de 1964 e 1968 fogem do quadro geral que procuramos estabelecer.

As intervenções militares pouco tiveram do caráter "moderador" com que as revestimos depois de 1954. Com alguma licença interpretativa poderíamos atribuir tal caráter à deposição de Vargas em 1945 e à Novembrada de 1955. Em 1945, conhecida a decisão de Vargas de renunciar, o respeito à Constituição de 1937, outorgada por golpe de Estado, foi solução proposta pelo general Dutra para evitar uma crise na hipótese de um general pretender assumir o poder. Em 1955, igualmente se respeitou, em termos estritos, a Constituição de 1946 e, ainda que o mote "retorno aos quadros constitucionais vigentes" deixasse claro que os comandantes da tropa (e os políticos civis a eles ligados) pretendiam dar a entender que a Constituição tinha sido violada, o que havia, a rigor, era a propaganda de Lacerda, que pregava que JK não deveria tomar posse.

De 1937 a 1964 houve profunda transformação no ethos militar, as Forças Armadas decidindo assumir o poder. Fator capital nessa mudança foi a pessoa política de João Goulart. Julgado pelos coronéis em 1953 e pelos ministros militares em 1961, foi condenado pelos generais em 1964. O poder de editar atos institucionais, fechar o Congresso, cassar mandatos e expedir decretos-leis não se confunde com o Poder Moderador do imperador. Abriu caminho para que os generais conduzissem ao total isolamento das Forças Armadas na estrutura do Estado. E abriu caminho para que desaparecesse para sempre a figura do totem, que Oliveira Viana tão bem identificou no Império.


*Oliveiros S. Ferreira é professor da USP e da PUC-SP. É membro do Gabinete e Oficina de Livre Pensamento Estratégico. Site: www.oliveiros.com.br.

quinta-feira, 10 de abril de 2014

REFORÇO GAÚCHO


ZERO HORA 10 de abril de 2014 | N° 17759

LIZIE ANTONELLO | SANTA MARIA


Unidades do RS atuarão no complexo da Maré

No total, 800 pessoas, entre homens e mulheres de Santa Maria, irão para o Rio no final de maio



Em menos de um mês, uma tropa de 2,1 mil militares irá compor a Força de Pacificação do complexo da Maré, no Rio de Janeiro. A maior parte, 800 homens e mulheres, partirá de Santa Maria, da 3ª Divisão de Exército.

Apreparação dos militares começará entre o final deste mês e o início de maio. Eles atuarão de 31 de maio até final de julho nas favelas da Maré, em missões de patrulhamento. O objetivo é assegurar a presença do Estado no complexo (leia sobre a ocupação no quadro).

A tropa será comandada pelo general de brigada Mauro Sinott Lopes, comandante da 6ª Brigada de Infantaria Blindada sediada na região central do Estado. O efetivo será composto por um comando, um batalhão de força de pacificação e um destacamento de apoio logístico, somando 800 militares de Santa Maria. Além desses, haverá uma tropa com mais dois batalhões de força de pacificação de militares do Rio de Janeiro, um batalhão de força de pacificação de fuzileiros navais da capital fluminense e um esquadrão de cavalaria mecanizada do 19º Regimento de Cavalaria Mecanizada, sediado em Santa Rosa – composto por 160 militares, divididos em dois pelotões da cidade gaúcha e um pelotão de Cascavel, no Paraná.

– Estamos sendo acionados e temos condições de fazer um ótimo trabalho. Nossos militares são preparados para atuar dentro das nossas comunidades – garante o general de divisão da 3ª DE, Geraldo Antônio Miotto.

Objetivo é manter direito de ir e vir, afirma comandante

A experiência vem da participação na Força de Pacificação do complexo da Penha e do Alemão e também nas missões ao Haiti, onde tropas de Santa Maria atuaram.

– Vamos para que a população possa exercer seu direito de cidadania, de ir e vir, para que as crianças possam ir à escola, as pessoas de idade possam atender aos seus filhos e netos, os homens e mulheres de bem possam trabalhar – explica Miotto, comandante da 3ª DE.


Mesma tropa irá ao Haiti no fim do ano

A maioria dos militares, cerca de 95%, é a mesma selecionada para compor o próximo Batalhão de Força de Paz no Haiti em outubro ou novembro deste ano.

Conforme o general Geraldo Miotto, da 3ªDE, eles já passaram por testes psicológicos e físicos e estão em condições de atuarem na Força de Pacificação. Para irem à Maré, eles passarão por mais uma etapa de preparação. A maioria treinará em Santa Maria, mas um grupo irá para o Centro de Operações de Garantia da Lei e da Ordem, em Campinas (SP).

A preparação começará entre o final de abril e o início de maio, após a primeira visita de reconhecimento ao complexo que será feita por uma comitiva formada pelo comandante da 3ª DE e por um oficial da 6ª Brigada. Eles viajam ao Rio de Janeiro em 22 de abril.

Os militares escolhidos atuam nas áreas de infantaria, cavalaria, saúde, suprimentos, alimentação, munição, combustíveis, manutenção, material bélico, comunicações e inteligência, entre outras.


A OCUPAÇÃO
O que está previsto para pacificar a área

- O complexo da Maré é formado por 11 favelas e fica nas proximidades do Aeroporto Internacional Tom Jobim (antigo Galeão).

- O local, segundo as Forças Armadas, é reduto do Comando Vermelho, maior facção criminosa do Rio.

- A primeira ação das Forças Armadas na Maré no processo de pacificação foi no dia 26 de março deste ano, quando 15 homens do 1º Batalhão de Engenharia de Combate (Escola) do Exército do Rio de Janeiro fizeram uma varredura na favela Nova Holanda.

- A Maré foi ocupada pelo Exército a pedido do governo estadual em 5 de abril. A operação foi batizada de “São Francisco” e é coordenada pelo Comando Militar do Leste (CML), com tropas do Exército e da Marinha, que substituíram parte do efetivo da Polícia Militar que já ocupava o local.

- São 2.050 militares da Brigada de Infantaria Paraquedista do Exército, 450 da Marinha, 200 da Polícia Militar e uma equipe avançada da Polícia Civil.

- Desde o começo da ocupação, foram registrados alguns protestos e disparo de tiros contra as tropas.
- No último registro, na segunda-feira passada, um mototaxista foi atingido no braço.

- De acordo com o Ministério da Defesa, a Força de Pacificação atuará até 31 de julho, em uma área de cerca de 10 quilômetros quadrados.

- A operação faz parte do esquema de segurança para a Copa do Mundo.

quarta-feira, 9 de abril de 2014

FORÇAS ARMADAS NÃO PEDIRAM PARA ATUAR EM AÇÕES DE SEGURANÇA


Celso Amorim diz que Forças Armadas não pediram para atuar em ações de segurança. Durante audiência em comissão da Câmara, ministro diz que militares recebem pedido de governador. Exército e Marinha ocupam favelas do Complexo da Maré desde sábado

EVANDRO ÉBOLI 
O GLOBO
Atualizado:9/04/14 - 15h04

Em audiência na Câmara, Celso Amorim diz que Forças Amadas não estão buscando essas missões Ailton de Freitas / O Globo


BRASÍLIA - Questionado por deputados sobre o emprego das Forças Armadas nas chamadas operações da Garantia da Lei e da Ordem (GLO), caso da ocupação do Complexo da Maré, na Zona Norte do Rio, o ministro da Defesa, Celso Amorim, afirmou que os militares não estão pedindo para atuar nessas ações. Amorim afirmou que, "ao contrário", os militares não estão atrás desse tipo de emprego. As declarações do ministro foram feitas nesta quarta-feira em audiência pública que acontece na Comissão de Relações Exteriores da Câmara.

- Não são as Forças Armadas que estão pedindo (para agir na GLO). Não estamos buscando essas missões. Elas recebem o pedido do governador, que passa pela presidente da República. É uma missão - afirmou Amorim.

- As Forças Armadas não estão precisando de situações para serem empregadas. Até pelo contrário - disse o ministro.

Celso Amorim rebateu a críticas de alguns parlamentares sobre o emprego de Exército, Marinha e Aeronáutica nesses casos. O líder do PSOL, Ivan Valente (SP), que é autor de um projeto sustando o uso de militares nas GLO e os efeitos do recém-criado manual que regulamentou essas ações.

- O que está ocorrendo na favela da Maré é uma invasão em massa de domicílio. Os militares estão invadindo a esfera dos direitos individuais - disse Valente, que teme pela repressão às manifestações.

O parlamentar criticou o uso de expressões como "força oponente" no manual. Essa expressão foi revisada pelo ministro e excluída numa segunda versão do texto.

- Concordo plenamente que essas manifestações têm que preservadas. Não há o propósito na GLO de cercear esse direito. Algumas expressões que geravam ambiguidade foram excluídas do manual. O objetivo é dar clareza até para que o militar não se exceda. O que fazer, como pode atuar. Saber quais são os limites - disse Amorim.

O ministro foi também perguntado sobre possível revisão da Lei de Anistia e sobre as sindicâncias abertas nas três forças para apurar denúncias de que unidades militares foram utilizadas como centros de tortura durante a ditadura. Amorim afirmou que a Lei de Anistia, sua possível revisão, não consta na agenda do governo e repetiu declaração da presidente Dilma Rousseff de que "há pactos que fizeram parte da vida política do país", numa referência aos efeitos da legislação, de 1979, que impede punição para militares que cometeram excessos naquele período.



NOVOS FARDAMENTOS

Foto: Jean Pimentel / Agencia RBS


ZERO HORA 09/04/2014 | 07h03

Militares do Centro de Instrução de Blindados testaram vestimenta. Os militares responderam a questionários, e os relatórios foram enviados para Brasília


Lizie Antonello


O Exército Brasileiro terá um novo uniforme. E Santa Maria, que tem o segundo contingente do país, foi uma das cidades escolhidas para testar o fardamento que será utilizado por combatentes de todo o Brasil.

Dez oficiais, sargentos, cabos e soldados - sendo nove do Centro de Instrução de Blindados (CIBlid) e um da 6ª Brigada de Infantaria Blindada - usaram a vestimenta, que inclui gandola (casaco), calça e gorro (leia as diferenças à direita), projetada e confeccionada pelo setor de pesquisa e desenvolvimento do próprio Exército. O teste ocorreu entre agosto de 2013 e janeiro de 2014.

A roupa é mais maleável que a atual, usada desde o início da década de 1990. Também é mais utilitária (com mais bolsos) e resistente. Porém, pesa cerca de 150 gramas a mais. A mudança chega no período em que o Exército passa por uma série de alterações (leia abaixo). Outras unidades militares em diversas regiões do Brasil, como Pantanal, Amazônia e Rio de Janeiro, participam dos testes.

O objetivo, segundo o major Alisson Rodrigues de Oliveira, do CIBld, foi verificar como a farda iria se comportar quando exposta às diferentes condições climáticas e características das regiões do território nacional.
- O desenho foi feito dentro do Exército para atender as demandas atuais que o Exército recebe. Assim como mudam as missões e os ambientes em que elas são desenvolvidas, foi necessário também mudar a roupa. Fizemos uma avaliação operacional, de usuário, e verificamos que ela é mais resistente, seca mais rápido, e a sensação é que o tecido é mais leve, menos quente. Isso tudo melhora o desempenho do militar durante uma missão - explica o major.

Os exemplares testados foram recebidos da Diretoria de Suprimentos do Exército, no Comando Logístico, em Brasília. As gandolas e as calças chegaram a Santa Maria em agosto do ano passado e foram testadas por cerca de dois meses. Já os gorros chegaram em novembro de 2013, sendo usados até janeiro deste ano.
- O problema das outras fardas é que são muito quentes, essa é mais leve. Achei o tecido mais fino e mais resistente, tem reforços, proporciona mais mobilidade. A quantidade e forma de abertura dos bolsos facilitam também - relata o sargento Daian Augusto Nunes, 30 anos, um dos militares que testaram o novo uniforme.

Ainda não há prazo para licitação de fabricante

Os militares responderam a questionários, e os relatórios foram enviados para Brasília, que irá reunir os dados e verificar possíveis alterações no modelo. Batido o martelo sobre o produto final, será elaborada uma especificação técnica do uniforme, fazendo descrições, como a estampa e o material da composição. Com essas especificações formadas, será aberto processo de licitação para escolher a empresa que fabricação o fardamento.
Não há prazo para que seja aberta licitação para a confecção dos novos uniformes.
As outras roupas utilizadas pelos militares, como camisetas e bermudas, permanecerão as mesmas, pelo menos por enquanto. A fabricação de novos modelos de outras peças, como o macacão para operadores de blindados e uma jaqueta de inverno, ainda estão em estudo pelo setor de pesquisa e desenvolvimento do Exército.

ALGUMAS MUDANÇAS NO EXÉRCITO

- Até 2015, Santa Maria deve receber investimentos de mais de R$ 500 milhões com a construção do Centro de Adestramento e Avaliação-Sul (CAASul) 

- O complexo treinará entre 500 e 1,5 mil militares de tropas blindadas e mecanizadas ao mesmo tempo quando estiver em funcionamento 

- O país passa por um processo de renovação da frota que começou com a compra dos Leopard adquiridos do Exército Alemão, em 2009, e, recentemente, com os Gepard no ano passado 

- A instalação da KMW em Santa Maria também acena com uma mudança na lógica do Exército de comprar equipamentos de outros governos, agora, a aquisição será do fabricante 

- Outra mudança será das unidades subordinadas à 6ª Divisão de Exército (6ª DE), com sede em Porto Alegre, que passarão a reportar para a 3ª DE com sede em Santa Maria. O objetivo é racionalizar o emprego de pessoal, material e recursos.



 





DIÁRIO DE SANTA MARIA

sábado, 5 de abril de 2014

FORÇAS ARMADAS OCUPAM COMPLEXO DA MARÉ


Pacificação: Forças Armadas ocupam o Complexo da Maré. São 2.750 homens do Exército, da Marinha e da Polícia Militar. Casas estão sendo revistadas em Nova Holanda. Clima é de tranquilidade. A previsão é que as tropas federais fiquem no local até 31 de julho

ANA CLÁUDIA COSTA
LEONARDO BARROS
EMANUEL ALENCAR
VERA ARAÚJO
CAROLINA RIBEIRO
O GLOBO
Atualizado:5/04/14 - 14h24

Tropas do Exército patrulham as ruas do Complexo da Mare / Ivo Gonzalez / O Globo


RIO - Os 2.750 homens das Forças Armadas e da Polícia Militar ocupam o Complexo da Maré. São 2.050 militares da Brigada Paraquedista, 500 fuzileiros navais e 200 policiais militares, que entraram neste sábado, seguindo um planejamento elaborado há quase duas semanas pelo Centro de Comando de Operações do Comando Militar do Leste (CML) do Exército. Os militares vieram em blindados preparados para situações extremas, caso os traficantes quisessem entrar em confronto com a Força de Pacificação. Eles substituíram, por volta das 8h, os 300 policiais militares do Batalhão de Operações Especiais (Bope) e do Batalhão de Choque que entraram na Maré semana passada.

— Estamos selando uma nova ação de apoio à seguranca do estado do Rio. É uma missão de apoio, temporária, como naturalmente devem ser as participações das Forças Armadas em questões de segurança pública, mas que será desempenhada com todo empenho e dedicação, como já ocorreu no passado, na ocupação do Complexo do Alemão — disse o ministro da Defesa, Celso Amorim, que com o governador do Rio, Luiz Fernando Pezão, assinou o documento oficial para a criação da Força de Pacificação do Complexo da Maré.

Além de Amorim e Pezão, participaram da cerimônia o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, o secretário de Segurança, José Mariano Beltrame, e o comandante militar do Leste, Francisco Modesto. Há cerca de duas semanas, o governo estadual e o Ministério da Defesa já haviam firmado acordo para a Garantia da Lei e da Ordem (GLO) na região, com a finalidade de iniciar o processo de pacificação do conjunto de 16 favelas na área.

A movimentação começou por volta de 3h30m. Caminhões e jipes do Exército passaram pela Avenida Brasil e Linha Vermelha e, em seguida, pararam nas principais vias. Não há registro de confrontos e o clima é de tranquilidade. Todos os veículos que passam pelas vias estão sendo revistados.

Na Rua Teixeira Ribeiro, um dos acessos à comunidade Nova Holanda, onde aos sábados é montada uma feira de alimentos e de produtos de construção, os comerciantes demoraram a levantar as barracas. Robertinho de Belém, vendedor de eletrônicos, estima que o público da feira tenha caído 40%. Ele chega a faturar R$ 800 por sábado.

— Cheguei a ligar para os amigos para saber se teria feira. O pessoal fica com medo, né? Mas está tudo na paz — disse.

Também na Nova Holanda, militares do Exército revistam as casas. Na Rua Sargento Silva Nunes, na comunidade, e em outras vias do Parque União, moradores mantêm a rotina. Bem cedo, eles saíram para trabalhar e disseram que não haveria confronto.

— Pode tirar o colete (à prova de balas), não vai ter tiroteio, não — disse um morador ao repórter do GLOBO.

Apesar da tranquilidade, os moradores ainda não sabem se a ocupação surtirá o efeito esperado.

— Acho que as coisas vão melhorar, sim. Mas só o tempo vai dizer — afirmou outro, que também preferiu não se identificar.

De uma maneira geral, os moradores estão com medo de comentar o assunto.

— Você acha mesmo que eles (os traficantes) foram embora? — indagou uma moradora.

Uma companhia da PM ficará a serviço das Forças Armadas. A Marinha instalará uma base na Vila dos Pinheiros. A previsão é que as tropas fiquem no local pelo menos até o dia 31 de julho. Ainda hoje será divulgado um número de telefone para que os moradores façam denúncias anônimas.

Favelas divididas por facções

Os militares assumiram as operações de busca a criminosos, drogas e armas. Equipes do Exército e da Marinha se dividiram nas favelas de acordo com o território ocupado anteriormente pelos bandidos. A Brigada de Paraquedistas do Exército está na Nova Holanda e no Parque União. Os fuzileiros navais e uma parte do Exército ficaram na Vila dos Pinheiros, Vila do João, Salsa e Merengue, cujo chefe do tráfico era o bandido Menor P, já preso. Na Roquete Pinto e na Praia de Ramos, estão também tropas do Exército. Tanques dão suporte às tropas.

Na sexta-feira, o clima nas favelas era de tensão e medo. Um morador disse que o tráfico permanece no local:

— Traficantes armados circulam pela Salsa e Merengue.

Denúncias anônimas de moradores estão ajudando a polícia a encontrar esconderijos de armas e drogas. São bilhetes e sinais passados discretamente porque a população das comunidades ainda convive com traficantes armados. Nesta sexta-feira, um policial contou que, à noite, a movimentação de bandidos, na região conhecida como Divisa, é grande:

— A situação não está sob controle.

Para a passagem do comboio das Forças Armadas em direção à Maré, a pista lateral da Avenida Brasil, sentido Zona Oeste, e as saídas 9B e 9C da Linha Amarela, sentido Fundão, ficaram bloqueadas das 3h30m às 6h30m.

Anfíbios da Marinha estão na Maré

Os 500 fuzileiros navais da Marinha, deslocados para a operação, já estão atuando no patrulhamento e em pontos estratégicos em comunidades da Maré com o objetivo de proteger pessoas e patrimônio, além de preservar a ordem pública. Foram utilizadas 12 viaturas blindadas da Marinha, sendo dois Carros Lagarta Anfíbio (CLAnf) e 10 do tipo Piranha III C, além de um helicóptero modelo Seahawk MH16. Os CLAnfs são de fabricação norte-americana, pesam 23 toneladas e têm capacidade para 25 militares armados e equipados para realizar operações anfíbias.

Nos veículos há duas metralhadoras: uma calibre .50 e outra, lançadora de granadas MK-19, de calibre 40mm. Além da capacidade de se deslocar na água, a partir dos Navios Anfíbios da Marinha, pode deslocar-se em terra com uma velocidade de até 72,4 Km/h. Tem autonomia de cerca de 483 Km em terra e de 7h em água.

Já os carros Piranha III C pesam 18,5 toneladas e transportam 13 militares armados. Ele possui autonomia de 700 Km e utiliza uma metralhadora capaz de comportar diferentes calibres. Além de ser um carro anfíbio, também trafega em terra, mesmo que todos os oito pneus estejam furados. Os integrantes do Grupamento Operativo de Fuzileiros Navais, como a maioria dos paraquedistas do Exército, têm experiência nas Missões de Paz do Haiti. Eles também atuaram na ocupação dos complexos do Alemão, da Penha, de São Carlos e do Lins, e ainda nas favelas da Rocinha, do Vidigal, da Chácara do Céu, da Mangueira, Jacarezinho, Barreira do Vasco e Caju.









Postado por Jorge Bengochea às 10:59

O PODER CIVIL FOI BATER À PORTA DOS QUARTÉIS


REVISTA VEJA, Blog Reinaldo Azevedo. 03/04/2014 às 18:54


No ano da satanização dos militares, o poder civil foi bater à porta dos quartéis

Um estrangeiro que ignorasse a nossa história, mas conseguisse ler a nossa imprensa, certamente chegaria à conclusão de que este é um país que padece de uma doença social rara, talvez única, nativa mesmo, como a jabuticaba. O nome dessa doença é esquizofrenia histórica.

Como sabemos, nestes 50 anos do chamado “golpe”, nunca os militares foram tão demonizados como agora. Alguns poderão dizer que não é bem assim; que as críticas são dirigidas aos desmandos e aos excessos havidos durante a ditadura, mas a gente sabe que isso não é verdade. Os militares são tratados como intrusos. Passa-se adiante a impressão de que tudo caminhava às mil maravilhas no mundo civil; de que o governo João Goulart era um exemplo de democracia e disciplina, e aí chegaram os gorilas fardados para nos tirar no paraíso. Notem: é evidente que eu acho que militares não têm de se ocupar da política. Mas acho também que as pessoas que se ocupam da história devem se ater aos fatos. E é fato que foi o governo civil de 1964 que criou as condições paro o golpe militar. Negá-lo é fazer pouco caso das evidências — e nada disso impede que se reconheçam os desmandos havidos, porque é certo que os houve. Ponto parágrafo.

O Brasil é governado por civis desde 1985. Embora as primeiras eleições diretas para presidente, depois do ciclo militar, tenham ocorrido só em 1989, chamar de “ditadura” o governo vigente em 1982, por exemplo, é um pouco mais do que licença poética — é mentira mesmo. Mas nem me atenho a isso agora. O fato é que, depois de quase três décadas, quando se precisa de uma referência de confiabilidade, de seriedade, de incorruptibilidade e de eficiência, eis que se apela às… Forças Armadas.

Garantir a segurança pública é tarefa precípua dos civis, é evidente. Sim, o artigo 142 da Constituição reconhece às Forças Armadas papel subsidiário na manutenção da lei e da ordem, mas essa não é sua tarefa primeira. Não obstante, a partir de sábado, 2050 homens da Brigada de Infantaria Paraquedista e 450 da Marinha vão ocupar o Complexo da Maré, no Rio. Lá ficarão, no mínimo, até 31 de julho — sim, leitores, a Copa do Mundo acontece nesse intervalo.

Pessoalmente, já disse, nada tenho contra a intervenção das Forças Armadas no combate ao narcotráfico. Há quase 30 anos, já disse, escrevi meu primeiro texto defendendo tal ação. Ocorre que não estou entre aqueles que saem por aí a defender uma tal desmilitarização da polícia — seja lá o que isso signifique — ou que tratam os militares como espantalhos.

E notem: no Complexo da Maré, o Exército e a Marinha não se limitarão a fazer um trabalho de apoio, não. Vão mesmo exercer função de polícia. Segundo o general Ronaldo Lundgren, chefe do Centro Operacional do Comando Militar do Leste, os homens estão autorizados a realizar patrulhamento ostensivo, revista e prisões em flagrante.

Todo cuidado é pouco. A chance de haver problemas é gigantesca. O narcotráfico costuma mobilizar agentes provocadores para incitar uma resposta violenta dos soldados e, assim, jogar a comunidade contra os militares. Lundgren afirmou, durante entrevista coletiva no Palácio Duque de Caxias, no Centro do Rio, que haverá um telefone para que os moradores da Maré possam denunciar eventuais abusos de autoridade.

Nos 50 anos do golpe, o poder civil foi bater à porta dos quartéis. Como se vê, as Forças Armadas não são intrusas, mas parte da história do Brasil.


Por Reinaldo Azevedo