quinta-feira, 1 de março de 2012

AS FORÇAS ARMADAS E A SEGURANÇA PÚBLICA

Carlos Melo. Recarga Tática, 15/02/2012


Nas operações especiais vivenciamos diretamente a briga entre as considerações políticas versus as considerações operacionais, sendo que nem sempre uma está alinhada com a outra. Com isso tem-se o prejuízo, seja ele qual for, inclusive com a deteriorização dos serviços e das necessidades intrínsecas a estes. A segurança pública está definhando por uma simples razão: não se faz o dever de casa, aquilo que deveria ser feito de ofício, isso acontece desde a concepção de qualquer política pública ligada à segurança do cidadão, sem contar que não existe continuidade, pois a todo novo governo temos uma nova política de segurança pública, desse jeito…sei não!

Texto extraído de http://www.defesanet.com.br/mout/noticia/4790/As-Armadilhas-das-Operacoes–GLO em 14 de fevereiro de 2012.

As Armadilhas das Operações GLO

O emprego das Forças Armadas, especialmente do Exército, em operações policiais em diversos estados tem sido sistemáticas, a partir da experiência positiva adquirida nas favelas do Rio de Janeiro, contra organizações criminosas envolvidas com o narcotráfico. Esta ação, denominada Garantia da Lei e da Ordem (GLO), com previsão constitucional, provavelmente contribuiu para mantê-la como instituição mais confiável para 49,6% dos brasileiros, segundo recente pesquisa realizada pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), no chamado Sistema de Indicadores de Percepção Social. Ainda, sob a influência deste sucesso, constatou-se uma mudança na percepção da opinião pública brasileira, materializada no resultado de 58,1% da amostra que entende como papel mais importante das Forças Armadas o combate à criminalidade em conjunto com as polícias estaduais. O restabelecimento da paz pública nos estados do Ceará e da Bahia, quando da greve das polícias militares daqueles estados deverá aumentar os índices desta percepção.

Inobstante, a conjuntura que envolve a área da segurança pública no país, de maneira geral, mostra-se frágil e com graves problemas estruturais que se arrastam por décadas e que são temporariamente minimizados pelas autoridades com ações paliativas e pontuais. Para muitos gestores governamentais, ainda persiste a visão de que segurança é feita exclusivamente com a presença ostensiva da polícia nas ruas ou mediante ações policiais sistemáticas, que na verdade, são apenas um item dentre um conjunto de políticas públicas complementares que deveriam ser instituídas com a finalidade de reduzir a desigualdade social, promover empregos, educação e saúde minimizando os impactos desta criminalidade na população. Assim, aumenta-se o efetivo das polícias, paga-se um salário aviltante com parcos investimentos na infra-estrutura, no treinamento de recursos humanos e em tecnologia, com expectativas de que estas instituições realizem milagres enquanto o essencial é porstergado.

O resultado desta visão cultural não poderia ser outro. O esgotamento de todo um sistema que já não consegue atender as necessidades básicas da população no que se refere a promoção da paz pública e da incolumidade física dos cidadãos, não apenas nas periferias mas agora também nos grandes centros urbanos. E neste contexto, ocorrem parcela significativa dos problemas atuais afetos a segurança como os constantes abusos aos direitos humanos, o aumento considerável na taxa de homicídios que atinge 50 mil/ano, recrudescimento da violência e da criminalidade, rebeliões em presídios, ações policiais catastróficas e as recentes greves em algumas das polícias militares por melhores salários, uma história que se repete desde 1997 com prejuízos irreparáveis a estas Instituições e flagrante desrespeito constitucional pela maneira como estão sendo operacionalizadas.

Quanto a aprovação da PEC 300, que fixa um piso nacional entre outras vantagens, outro objetivo das recentes greve, existem diversas correntes, uma que entende não ser matéria que a União possa legislar uma vez que as polícias militares são competência de cada estado federativo, regidas por Leis e Decretos estaduais. E mesmo que seja votada no Congresso, a exemplo do piso nacional dos professores, além da necessidade de regulamentação estadual, os estados poderão alegar não possuírem recursos para tal pagamento, voltando-se ao ponto de partida, o que provavelmente ocorrerá.

Nesta perspectiva, torna-se evidente que todo este sistema, embora alguns avanços, necessita urgentemente de uma reengenharia, de uma nova visão gerencial e policial que permita acompanhar o dinamismo da criminalidade e as crescentes ameaças surgidas das diferentes e globalizadas relações sociais. Este pensamento é compartilhado por segmentos significativos da sociedade brasileira medidos por meio de dezenas de pesquisas de opinião realizadas por diferentes e respeitados órgãos nos últimos anos com conclusões científicas.

Não é aceitável que em um país que detém a sexta economia mundial e encontre-se em franco desenvolvimento, apresente tamanho grau de vulnerabilidade interna, facilitada pela ausência de políticas públicas e investimentos, pelo caos no sistema carcerário e por uma legislação penal arcaica de 1940, transformando cidadãos em reféns pela restrição à liberdade de locomoção e acesso aos espaços comunitários. Mantido o status atual, lamentavelmente, os eventuais sucessos conquistados na área da segurança pública no país podem ser apenas aparentes e tendem a se transformar, com o tempo, em tormentosos fracassos, alimentando a fome insaciável deste sistema arcaico por novas e midiáticas ações, igualmente paliativas. Assim, a chamada GLO pode se transformar em uma armadilha onde as Instituições que a operacionalizam tendem a perder gradativamente a mística, entre outros valores.

Carlos Melo é Especialista em Segurança Pública pela Academia de Polícia Militar de Brasília (APMB, 1997), serviu no BOpE/PMDF por 7 anos. Exerceu cargo na Polícia da ONU (UNPOL) na Missão das Nações Unidas em Timor Leste(UNMIT – 2008 e 2009), onde executou as atividades de investigador policial

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